"Amor é o básico necessário, e isso não tem nada a ver com dinheiro", Charles Nelson III
Será que o apego materno tem efeitos no desenvolvimento de um bebê? De acordo com uma pesquisa realizada na Romênia por pesquisadores americanos, a resposta é sim - e muito! A relação de crianças nos primeiros anos de vida com seus pais - biológicos ou adotivos- pode ser determinante para um bom desenvolvimento do cérebro.
O professor de pediatria e um dos autores da pesquisa, Charles Nelson III, da escola de medicina de Harvard, verificou que boa parte de distúrbios psicológicos e comportamentais constatados em adolescentes e adultos pode ser consequência da falta de atenção sofrida logo na primeira infância. A lista inclui problemas de relacionamento social, déficit de atenção, menor QI, síndromes similares a autismo e até déficit de crescimento (nanismo).
Isso acontece porque um cérebro menos maduro, como o de um bebê, é muito afetado por características fundamentais do ambiente, como a luz e a linguagem. Crianças criadas em orfanatos não recebem os estímulos necessários para o desenvolvimento, e por isso têm uma propensão maior a apresentar esses distúrbios do que aquelas que cresceram em um ambiente familiar, estimulante e enriquecedor.
Pode parecer óbvio, mas a pesquisa é importante para mostrar como, independente da situação socioeconômica, são o cuidado, o carinho e a atenção os maiores responsáveis pelo desenvolvimento da criança. "Amor é o básico necessário, e isso não tem nada a ver com dinheiro", diz Nelson.
A pesquisa, além de provar que abrigos podem ter um efeito negativo no desenvolvimento do cérebro, também apontou como há um período ideal em que é possível reverter os efeitos causados pela negligência: de preferência antes dos dois anos de idade.
Os dois primeiros anos de vida são fundamentais. O desenvolvimento do cérebro começa algumas semanas após a concepção e, logo na primeira infância, nossa capacidade de nos modificarmos devido à experiência é muito maior. O que acontece durante este período pode ter impacto muitos anos depois, inclusive na saúde mental e psicológica do adulto.
É por isso que cérebros muito jovens precisam de interatividade logo cedo. Gravações de áudio e televisão não são suficientes, o órgão requer uma vasta gama de estímulos linguísticos, cognitivos e sociais. Brincadeiras, desafios, interação real.
Em orfanatos e abrigos, crianças geralmente são criadas em grupo, por um número reduzido de cuidadoras. Assim, são por vezes submetidas a uma rotina regimental, isolamento, agressões e falta de cuidados. De acordo com Charles Nelson III, o fato de bebês ficarem separados em berços, por exemplo, parados durantes horas, apenas olhando para o teto, é um fator inibidor do desenvolvimento adequado, pois assim não se estimula o choro, a fala e o movimento.
Para Charles Nelson III, o maior desafio agora é transformar esta pesquisa em informações que cheguem aos políticos, clínicos e pais sobre as desvantagens de se criar crianças em orfanatos e os benefícios de criá-las em família.
A adoção de nada adianta sem os recursos necessários para se criar e garantir bons lares e evitar o abandono das crianças. É por isso que, para Nelson, torna-se cada vez mais importante incentivar o apego materno logo cedo. São necessárias políticas que eduquem os próprios pais sobre a melhor forma de cuidar do bebê
A pesquisa, uma parceria entre as Universidades de Tulane, Maryland, e o Children's Hospital Boston, acompanhou crianças criadas em orfanatos e em casas de famílias desde 2000, na cidade de Bucareste, Romênia. No início, os pesquisadores separam um grupo de crianças de orfanatos e as transferiram para lares adotivos. A outra metade permaneceu sob os cuidados da instituição.
A partir de então, testes e acompanhamentos foram realizados com ambos os grupos aos 30, 42 e 54 meses de idades dos bebês, e novamente quando completaram oito anos, de forma que foi possível comparar o desenvolvimento cerebral de crianças criadas em orfanatos com o de aquelas adotadas e, ainda, com o de crianças que nunca tinham passado por uma instituição que cuide de crianças órfãs ou abandonadas.
FAMÍLIA
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